Fila para cidadania italiana tem
500 mil brasileiros
Valquíria Rey - De Roma para a BBC Brasil
Ter o passaporte italiano facilita a entrada nos EUA e na Inglaterra,
por exemplo.
Números da Embaixada da Itália, em Brasília, mostram que cerca de 500
mil brasileiros estão na fila de espera em consulados para o
reconhecimento da cidadania italiana.
O número é praticamente o dobro do total de brasileiros que já
conseguiu cidadania por descendência.
"O número de brasileiros que já conseguiu obter a cidadania italiana
por descendência é de cerca de 215 mil", informou à BBC Brasil o
primeiro conselheiro do Departamento de Assuntos Consulares da
Embaixada Italiana, em Brasília, Alberto Colella.
Apesar de ter direito garantido à segunda nacionalidade, a grande
maioria não sabe quando o documento chegará. Apenas que poderá demorar
meses, anos e até mesmo décadas.
Isso porque os consulados não se prepararam para a grande demanda e o
governo italiano ainda não acenou com processos de informatização, ou
mesmo contratação de novos empregados para lidar com o crescente número
de pedidos.
"Os principais consulados no Brasil fazem uma média de 50 a 60
legalizações por mês, em processos que englobam famílias de cinco, seis
e até dez pessoas", disse Imir Mulato, diretor da Agência Brasitalia,
especializada em buscas genealógicas e serviços sobre cidadania
italiana. "O governo italiano sabe que se colocasse mais funcionários,
acabaria com as filas. Sabe também que, se fizer isso, mais
ítalo-brasileiros irão para a Itália".
Segundo Imir Mulato, dentro dessa média, demoraria 30 anos para que
todos os pedidos feitos no Brasil até o momento terminassem de ser
avaliados.
Opção mais rápida
Para os que não querem esperar tanto, a opção é encaminhar a papelada
diretamente em uma prefeitura italiana e comprovar residência fixa no
país. Nesse caso, bastaria esperar de dois a quatro meses até se
conseguir o reconhecimento da cidadania.
Foi o que fez a empresária Silvia Lezcano, que mora nos Estados Unidos
há mais de uma década e resolveu passar uma temporada em Roma.
"Decidi encaminhar a papelada para facilitar a vida da minha filha mais
velha", disse. "Ela sonha em fazer uma faculdade em Londres. Com o
passaporte italiano, tudo se tornaria mais fácil".
A cidadania italiana é regulamentada pela lei número 91 de 5 de
fevereiro de 1992. Baseia-se no princípio do jus sanguinis – termo
latino que indica direito de sangue – e pode ser transmitida a todos
que têm ascendência italiana por parte de pai em todas as gerações.
Podem ser filhos, netos, bisnetos ou mesmo descendentes de gerações
mais distantes.
Já do lado materno, a nacionalidade é restrita a quem nasceu depois de
1948, quando a Itália igualou direitos de homens e mulheres.
Mercado
Em função do contingente de cidadãos brasileiros com direito à segunda
nacionalidade, a quantidade de escritórios especializados em processos
de cidadania italiana é grande. Alguns escritórios cobram até R$ 5 mil
para reunir e encaminhar documentos aos consulados.
Se o cliente desejar o auxílio na Itália, alguns escritórios arrumam
residência fixa no país, onde a pessoa ficará morando até conseguir a
cidadania. O serviço custa em média 2,5 mil euros (R$6,7 mil).
Por ter uma das legislações mais flexíveis da União Européia, a Itália
criou vantagens para seus descendentes inexistentes nos países do bloco
europeu, que limitam a concessão da cidadania a filhos e netos.
Para os descendentes de italianos é tudo mais fácil. Um bisneto, por
exemplo, pode obter a cidadania italiana e trabalhar regularmente em
Londres ou Madri, o que é impossível para um bisneto de espanhóis, que
não tem direito ao passaporte.
Estima-se que entre 300 e 400 brasileiros com passaporte italiano
viagem à Itália todos os meses. Desses, apenas 10% ficam no país, 10%
retornam ao Brasil, 40% vão à Inglaterra e os restantes 40% têm como
destino outros países europeus, principalmente Espanha e Portugal.
"O sonho do imigrante brasileiro na Europa é ir para Londres", assinala
o demógrafo do Programa de Pós-graduação em Geografia da PUC-Minas,
Duval Fernandes. "Lá trabalha-se por hora, o mercado é desregulamentado
e ganha-se numa moeda estável e forte."
Rumores de mudança
Apesar dos rumores no ano passado de que a lei da cidadania mudaria,
restringindo o direito apenas a filhos e netos de italianos nada
aconteceu.
Mas um Projeto de Lei de iniciativa do governo está em análise na
Câmara dos Deputados e prevê algumas modificações.
Entre elas, a introdução do jus soli – nacionalidade pelo lugar de
nascimento –, como princípio de transmissão da cidadania, e o direito
dos descendentes de italianas nascidos antes de 1948.
"Não existe nenhum projeto de lei ou emenda que prevê alguma limitação
ao jus sanguinis", afirmou o senador Edoardo Polastri, eleito em 2006
pelos italianos que moram na América do Sul.
Original:
www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2008/03/080129_imigracaofilaitalianos.shtml
Publicado neste site em 26/03/2008.
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